Dove é acusada de racismo e se desculpa após treta nas redes sociais


Deu ruim pra Dove.

Super conhecida por campanhas premiadíssimas que combatem estereótipos e enaltecem a real beleza, a marca se envolveu em uma puta treta por conta de um anúncio na página norte-americana, acusado de racista.

As hashtags #DoveIsRacist e #BoycottDove bombaram nos TTs do Twitter. Após a enorme repercussão negativa, a Dove, então, apagou o post e pediu desculpas.




Taí excelente oportunidade pra gente pensar sobre a estratégia de algumas marcas que defendem a diversidade em seus esforços de comunicação.

Vem comigo que no caminho te explico.


Um gif de 3 segundos foi o estopim da treta. A imagem em looping mostra uma mulher negra tirando uma blusa marrom, revelando uma mulher branca.

O gif foi capturado pela especialista em maquiagem @NayTheMua, a influenciadora, com 76 mil seguidores no Facebook, não ficou calada:



A marca excluiu a postagem e pediu desculpas públicas. No domingo, divulgou um comunicado: "Isso não representou a diversidade da beleza real, que é algo pela qual Dove é apaixonada e é essencial para nossas crenças. Isso não deveria ter acontecido".

"Pedimos desculpas profundas e sinceras pela ofensa que causou e não toleramos nenhuma atividade ou imagem que insulte qualquer público".




"Uma imagem que postamos recentemente no Facebook errou ao representar mulheres negras. Nós nos arrependemos profundamente da ofensa causada."

Veja também o post de desculpas no Facebook.



"Dove está empenhada em representar a beleza da diversidade. Em uma imagem que publicamos nesta semana, erramos em representar mulheres negras de forma desrespeitosa e lamentamos profundamente a ofensa que isso causou. O feedback que foi compartilhado é importante para nós e nós o usaremos para nos orientar no futuro."

Na segunda, 9, a Dove enviou um comunicado à imprensa em que diz:

"Como parte da campanha de Dove Body Wash, um vídeo de 3 segundos foi postado no perfil do Facebook da marca nos Estados Unidos. Isso não representa a diversidade da real beleza pela qual Dove é apaixonada e que é essencial para nossas crenças e não deveria ter sido produzido. Removemos o post e não publicaremos nenhum outro conteúdo relacionado. Sinceramente e profundamente, pedimos desculpas pela ofensa que a peça causou e não toleramos nenhuma atividade ou imagem que insulte nossa audiência."

O gif polêmico mostrava, em seguida, a mulher branca tirando sua camisa bege e revelando uma terceira mulher:


"Ah, então a peça tinha um contexto". Tinha.




Antes de julgadores de ocasião acusarem de mimimi a influenciadora, que é negra, é importante frisar que somente quem sofre racismo tem autoridade pra dizer se algo é ou não racista. Um pouco mais de empatia não faz mal a ninguém.

Quando o assunto é racismo é importante não diminuir jamais a questão ou achar que a polêmica é exagerada, explica a pesquisadora e professora Hilaine Yaccoub, PHD em Antropologia do Consumo.

"O racismo é estrutural. Quando digo isso estou me referindo a uma arma mordaz que é a forma naturalizada para como vemos as coisas, as situações, porque quando não é com a gente, ou seja, quando não somos as vítimas ou os afetados, que mal há? Nos dizem sempre 'é exagero', 'isso é coisa de gente que não se aceita' ou ainda 'isso aí é barulho dos movimentos negros'".




Outra coisa que chama atenção é como a Dove, que faz há anos um gigantesco esforço de comunicação, erguendo a bandeira da auto-estima, comete um fail desses, de forma tão primária?

"Uma marca que sempre defendeu a aceitação de si mesma, da valorização do corpo, do cabelo e do 'vamos-festejar-nossos-corpos' não deveria mais passar por tal constrangimento", afirma Hilaine.


É realmente impressionante como um gif de 3 segundos bota ladeira abaixo a reputação da Dove, construída ao longo de uma década defendendo uma causa tão importante.

O fail rendeu nas redes sociais. As pessoas lembraram outros vacilos da marca de cosméticos da Unilever.




Em 2011, a empresa foi acusada de racismo por uma campanha que também seguia a linha "Antes e Depois".

A imagem dava a entender que a mulher negra seria o "antes" e a branca o resultado final, "melhorado", após o uso do produto.


Pode ter sido apenas um terrível erro de direção de arte? Pode. O "antes e depois" seria para todas as três modelos, mas isso não ficou claro na imagem. Na forma como foram dispostos os elementos na peça, parece de fato que a pele negra seria correspondente ao "antes".

Já em 2015, a Dove foi centro de outra polêmica ao lançar um bronzeador que era recomendado para uso em peles "de normal a escuras", o que sugere que a pele escura não seria normal.


Além de resgatar esses episódios protagonizados pela marca, a discussão foi ainda mais longe. Muitas pessoas lembraram que as empresas de sabonete carregam um triste histórico de associação de seus produtos ao racismo.

O produtor de cinema Tariq Nasheed e o historiador Francois Soyer recordaram que já ocorreram no passado dos EUA casos de propagandas racistas com foco na venda de produtos de limpeza.




"Sejamos claros, Dove sabia exatamente o que estavam fazendo com seu anúncio racista. As empresas de sabão costumavam fazer esse tema racista o tempo todo."




"Contexto para o escândalo do anúncio Dove: há uma longa história de anúncios racistas usados para vender sabão no Ocidente."

Essas lembranças e associações à tão terrível memória passou pela cabeça das pessoas, como não ocorreu para os executivos da marca? Como ninguém ao longo do processo de criação, produção e aprovação dessas peças alertou para o fato de que a imagem poderia causar algum ruído ou problema?




A pergunta que fica é como ninguém apontou que havia na peça um problema grave de cognição que poderia suscitar algum tipo de entendimento profundamente negativo?




Isto é prova de que não basta a marca encontrar um posicionamento que a conecte com as pessoas. É preciso, mais do que nunca, que esse posicionamento seja transmitido em cada movimento, conversa ou ponto de contato - até num gif de 3 segundos.

Em um mundo cada vez mais devassado pelas redes sociais, a marca precisa estar atenta a cada gesto, por menor que seja, para evitar uma possível crise.

Outra questão importante é que não vale o "Faça o que eu digo, não faça o que eu faço". Não basta a marca defender posturas na comunicação que não se sustentam na atuação da empresa. Storytelling sem storydoing [leia-se blá-blá-blá sem atitude] é papo-furado e as pessoas estarão mais motivadas a atacar a hipocrisia.

"Os gays, as trans, os mano da perifa, os favelados, os "paraíbas" ou "baianos", os negros de todos os tons de pele que estão no padrão tipo exportação, ganham dinheiro [figurando nas campanhas], mas me pergunto: quantos estão empregados na sua empresa? Não, não vale apontar a tia da copa, okey?", comenta Hilaine sobre marcas que buscam defender a causa da diversidade.

Leia o textão que a antropóloga postou em seu perfil. Vale muito a pena, uma sensacional aula sobre respeito à diversidade. E, em seguida, confira outros conteúdos relacionados.



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